Behind Business (BB) - Como chegaste a ser empreendedora? Sentiste vontade de fazer um spinoff na tua vida?
Daniela - Na verdade, foi o spinoff que veio até mim!
Como assim!?
Eu tinha a minha carreira médica no hospital e na faculdade. Enquanto isso, terminei também o meu doutoramento e, sendo médica neurorradiologista, já lidava com tecnologia, em particular com processamento de imagem. A crise financeira chegou e eu decidi fazer o MBA. Os últimos 6 meses do programa iriam focar-se na área da saúde. Isso não aconteceu porque não havia alunos suficientes para o curso abrir e eu tive de escolher outro e escolhi o de empreendedorismo. Acabou por ser uma boa escolha: para além do meu espírito empreendedor, para começar, o IE Business School já tem uma boa reputação no que toca ao empreendedorismo e, por isso, foi bastante útil - aprendi muito durante esse tempo, o que me ajudou a criar a empresa.
E a Tonicapp?
A TonicApp começou como um projeto académico de grupo do MBA, durante o curso de empreendedorismo. Depois, eu e os meus colegas continuámos a trabalhar nisso após o MBA; começou a ficar um pouco mais sério e até acabámos por ganhar um investimento de uma empresa de capital de risco. De repente, todo o meu tempo estava sendo consumido pela TonicApp e cheguei a um ponto que tinha de tomar a decisão de trabalhar a tempo inteiro nisso - caso contrário, se eu não o tivesse feito, iria arrepender-me para toda a vida.
"(...) temos de estudar, estudar, estudar para aprender com os erros dos outros e então, só depois, podemos experimentar, porque nessa altura já estaremos um passo à frente."
Parece que é uma atitude comum entre os empresários, que decidiram seguir em frente com o projeto porque sentiram, em algum momento da sua vida, que se arrependeriam se não tentassem sequer…
Sim, foi num momento em a coisa começou a tornar-se mais séria. Não foi o caso de estar zangada ou aborrecida com o que fazia... porque na verdade eu gostava, e ainda gosto, da minha carreira médica. Não foi por sentir que tinha de mudar a minha vida.
Há quanto tempo tudo começou?
Então, começou em 2015 no MBA; a empresa foi fundada em 2016 e o investimento da Portugal Ventures foi em dezembro desse ano. Tudo aconteceu muito rápido.
Trabalhaste bem então!
Bem e muito! Nestas coisas, só bem não chega.
Quais foram os teus maiores obstáculos no início de todo esse processo?
Acho que a coisa mais difícil era ter certeza de que o projeto teria espaço para crescer. Era difícil perceber isso porque precisávamos primeiro de validar todas as suposições que tínhamos feito antes, enquanto pensávamos na ideia. Foi importante porque tive de decidir se teria de deixar a minha carreira médica para me dedicar a tempo inteiro ao projeto, com todo o meu compromisso, pois já tinha uma carreira longa e gratificante. A outra coisa difícil foi perceber como é que nós, a equipa executiva - que estava fisicamente separada porque vivemos em diferentes países -, nos iríamos poder reunir e trabalhar juntos para um projeto sério, com compromisso e para fundar a empresa. No início, todos os co-fundadores contribuíram de igual forma para o projeto, mas após algum tempo, como eu morava em Portugal, onde a empresa seria fundada e financiada, comecei a ter muito trabalho. É por isso que decidimos recentemente alterar a organização - conseguimos trazer o Gonçalo Vilaça (na fotografia em cima) para me ajudar, como Diretor de Operações.
Qual foi a decisão mais difícil que tiveste de tomar nos últimos anos?
Bem, eu diria que numa startup temos decisões difíceis todas as semana, se não todos os dias. Tudo o que decidimos tem um impacto importante no nosso futuro, pois o que importa aqui é velocidade e execução. Mas, com certeza, a coisa mais difícil que tive de fazer recentemente foi demitir um funcionário.
Posso dizer que o lado humano do negócio é o que mais te afeta?
Afeta-me, sim, mas também é difícil encontrar um equilíbrio entre as pessoas da empresa e a própria empresa; nem sempre o que é melhor para as pessoas é o melhor para a empresa e vice-versa, e essa é a coisa mais difícil que um diretor executivo tem de gerir. Eu tenho que tomar decisões que não agradam a todos ao mesmo tempo.
App Screens | UX |
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Using a Touch Phone | Phone App |
Brain Sketch | Doctor with Files |
Doctor Operating CT Scanner | Elder woman and her caretaker |
Dental Tools in Pocket | 3d Ultrasound |
Patient with Healthcare Nurse |
Qual foi a maior conquista que tiveste como empreendedora?
Bem, eu poderia mencionar os clichês, e esses seriam os prémios que ganhámos, como por exemplo no Lisbon Investment Summit 2018 que foi organizado pela Beta-i; ou o investimento que obtivemos da Portugal Ventures; ou o momento em que nos tornamos a app número um na App Store - porque os médicos confiam na nossa plataforma; ou quando superámos a barreira dos 5000 utilizadores em menos de um ano. Estas são grandes conquistas e que me deixaram muito feliz. Mas o que me deixa mesmo feliz é quando a equipa se depara com um problema e se junta para poder resolvê-lo em equipa. Isso é o que realmente me deixa feliz e orgulhosa.
Como geres a incerteza?
Por um lado, tento não passar toda a incerteza para a equipa - significa que eu tenho que viver com ela sozinha. Por outro lado, eu lido com ela como muitas outras pessoas - fico com insónias. Muitas vezes.
Como escolhes as pessoas e como as encontras?
Este é um aspecto crucial de uma startup, atrair e reter talentos. Temos trabalhado por referências, alguém da equipa recomenda alguém com quem já trabalhou. As hard skills são importantes, mas, às vezes, também procuro alguém que tenha as capacidades necessárias para aprender as competências necessárias para as suas tarefas futuras. Muitas vezes podemos dar às pessoas espaço para se desenvolverem, outras vezes não temos essa oportunidade; às vezes as pessoas só conseguem desenvolver num ritmo mais lento do que o que a startup exige. Também é importante entender se a pessoa terá um bom fit no perfil da equipa atual e também se haverá um enquadramento na cultura da empresa. Sem isso, prefiro não seguir em frente com essa pessoa. Às vezes cometemos erros, é claro, e pensamos que as pessoas poderão encaixar-se, mas depois isso não acontece.
O que vos une e o que vos separa?
O que nos une são claramente os objetivos da empresa, que têm que ser realmente claros para todos, para toda a equipa estar alinhada e para que todos saibam qual o seu papel. O que realmente nos separa são os incentivos profissionais de cada um. Por exemplo, eu posso estar concentrada na reunião com investidores e os meus colegas estão preocupados com as suas tarefas, por exemplo, com o desenvolvimento das próximas funcionalidades ou com a comunicação na conferência na próxima semana, e assim por diante. Ao mesmo tempo, a equipa deve ser um espaço em que todos se possam reunir e conversar livremente e, assim, diminuir o nível de ansiedade.
Achas que o espírito empreendedor nasce connosco ou é desenvolvido?
É claro que isso pode ser aprendido e na IE Business School eu aprendi muito; existem muitos processos, frameworks que podem ser aprendidos... Na verdade, eu tive muitas vezes uma conversa engraçada com um professor do MBA que dizia que nós, como empreendedores, temos de experimentar, experimentar, experimentar, mas eu defendia que temos, em vez disso, de estudar, estudar, estudar para aprender com os erros dos outros e então, só depois, podemos experimentar, porque nessa altura já estaremos um passo à frente. Há sempre muitas coisas para aprender, como marketing, vendas, recursos humanos e muitos mais assuntos importantes para gerir um negócio. Para tentar estar sempre atualizada, eu leio um livro por semana.
Incrível! Mas por que não lês os resumos desses livros? Existem hoje em dia soluções para isso...
Não, não, não me fales em resumos! Eu quero lê-los todos porque durante a leitura eu tenho tempo para refletir sobre o assunto, sobre a empresa e sobre como eu poderia usaria isso no meu contexto. Este é o meu processo. Agora, acho que o espírito empreendedor nasce connosco quando a pessoa quer estar sempre a construir coisas novas e a querer vê-las crescer. E isso vem com a personalidade. Para teres uma ideia, com ou sem startup, eu nunca estava no sofá - eu descanso a fazer coisas. Por isso é que eu acho que esse é um perfil que nasce connosco.